quarta-feira, 24 de abril de 2013

Arte Poética de los Andes


Arte Poética de los Andes

Eu bem que poderia escrever um poema
sobre a beleza branca de Sucre
ou a imensidão do deserto de sal em Uyuni
Poderia cantar odes à lua
ao sol
descrever o modo como nascem e morrem
nessas paisagens deslumbrantes
cantar o charme das lhamas
a cor do canto dos pássaros
os sons das ruas e dos vilarejos no deserto
o silêncio das estrelas do céu do Atacama
a força dos gêiseres e da lava
o cheiro do Oceano Pacífico
que me invade enquanto escrevo esse poema

Bem que poderia
mas o sal em meus olhos não me deixa

As fronteiras rompidas em cruzadas de olhares
as dores sem pátria
tão minhas
me lamentam versos no ouvido
e não consigo me fazer de surdo

Urgências me consomem
a ponto de parecer sem sentido
falar dessas paisagens

Sua gente
tão minha
me chama
e me faz crer que é preciso contar
e cantar
os não-brancos que vivem nas sombras de Sucre
a vida deserta de quem extrai sal em Uyuni
a pobreza de países tão ricos
o sol que não nasce pra quem morre todo dia
nesses lugares deslumbrantes
os povoados e vilarejos que não povoam mais a Terra
as estrelas silenciadas pelos generais nas ditaduras
e quem eram os que tiveram seus sonhos interrompidos
por erupções de ódio em forma de coturno
a lei de pesca chilena que elitiza o mar
e naufraga o sustento dos pescadores

Sua gente
tão minha
me faz cantar esses silêncios
desgraças da raça humana
que até Pacha Mama cantaria
se soubesse escrever
mas como não sabe
apenas grita

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