terça-feira, 17 de maio de 2016

Cela-lar


Cela-lar

O celular de Naná
é a lua
(Otto)

Autorização pra se ausentar
repetidas vezes
o olho faz o ouvido ouvir fragmentos
parte do que é dito apenas
a duras penas
Conexão que desconexa a conversa
Cabeças confusas
frases que se perdem
num arrastar de dedo
num arrastar de olhos

Holograma ao contrário
tela que engole
o gole no copo atrasa
esfria se era quente
esquenta se era frio

Aplicativos desimplicativos
mundos nos dedos
e menos dedos no mundo

Fazer aquela cara meio sem graça
quando flagrado com o olho na botija
fingindo que ouvia
enquanto via outra coisa
meio sem jeito de perguntar de novo
que?”


Pedir desculpas por não estar presente
e continuar não estando
Perder as paisagens das janelas laterais
dos trajetos da vida

Tomar café da manhã com passarinhos
virtuais cantando mensagens
e mal ver o bem-te-vi lá fora

Vem almoçar menino
que o celular já tá na mesa
Vem jantar menina
que o celular já tá na mesa

Olhar a tela é desculpa mais aceitável
pra continuar não olhando
pra quem senta ao lado no metrô

Toque restrito à tela
Tanta gente com fome de ouvido
e tanta gente com fone de ouvido

Perder-se pouco
achar-se frequentemente
com a respiração presa
com a vida presa
Ficar mais perto
de quem mesmo?
Ficar mais esperto
pra que mesmo?

Prefiro vidrar os olhos no celular de Naná