SEM OUTRA FACE
Não chorarei por quem não fui
nem vou esconder atrás de desculpas esfarrapadas
meus farrapos
Meus vazios eu não tapo com peneiras
nem cubro com lençóis furados
Desaforos eu não trago pra dentro de casa
não tenho altar pra violência cotidiana
em cômodo nenhum
Minha raiva é certeira
e não atinge os meus nem as minhas
nem de raspão
(não se engane com os pronomes possessivos
não sou dono de nada nem ninguém)
Debocho dos cartões de Natal
e das propagandas de banco
Sou motivo de deboche
de fofocas
risinhos
e hipóteses malucas
talvez porque cultivo insanas sanidades
difíceis de explicar em almoços de família
e em mesas de bares gourmets
Carrego um exército de oprimidos nos ouvidos
e quando latejam de dor
de tanto ouvir isso que chamam de humor
censuro a liberdade de opressão
Me elogiam de chato
e sou
chato pra caralho
piada carrega ideia
e ideia enfrento com ideia
Levo a sério o que não tem graça
minha raiva é certeira
Se ofendem os meus e as minhas
se agridem os meus e as minhas
(não se engane com os pronomes possessivos
não sou dono de nada nem ninguém)
se conscientemente
agem pra conservar dores
e atravancam nosso caminho
eu e os dos meus ouvidos
gritamos em coro:
não passarão!
nem disfarçados de passarinho
(Lucas Bronzatto, Poema do livro Afronta Fronteiras!)